A companhia Comédias do Minho partiu de um projeto existente de uma rádio digital, que vinha de 2019, para responder à pandemia de covid-19 com uma plataforma de conteúdos, um 'takeaway' de "comida para o espírito", disse.
<p>No texto de apresentação do "Comédias Takeaway", a diretora artística, Magda Henriques, cita um trecho de uma entrevista do jornalista Carlos Vaz Marques ao escritor António Tabucchi, quando o primeiro pergunta "para que serve um livro?".</p> <p>"Num mundo em que tudo tem de ser útil, um livro talvez seja um objeto inútil, mas imprescindível", respondeu o autor de "O Jogo do Reverso", dando o mote a uma convicção "da arte como um bem imprescindível" que guia este menu de 'takeaway' de conteúdos que vão de filmes a registos de espetáculos, 'podcasts' ou 'audiodramas'.</p> <p>A ideia de "comida para o espírito" combate uma necessidade de todos, porque se pode morrer de fome, explica a responsável à Lusa, mas também "de outro tipo de fomes, espirituais, de solidão, de tédio".</p> <p>"Lembra-me um poema da Adília Lopes, do 'Estar em casa': 'Ou isto ou aquilo/ou isto ou aquilo/isto e aquilo'. A comida para o estômago e um teto para viver são fundamentais, mas a arte, o hospital, a comida, são igualmente fundamentais em proporções justas", garante Magda Henriques à Lusa.</p> <p>A pandemia de covid-19 afastou as Comédias dos palcos, e os confinamentos obrigaram a apressar uma aposta no digital que, conta a diretora artística, já vinha de 2019, com o projeto de uma rádio digital, a Rádio Comédias -- Imaginação Sem Fios.</p> <p>"Uma rádio digital, muito experimental, mas que já era concebida como uma rádio para escutar, ver e ler. Ou seja, muito antes da pandemia, já tinha esta dimensão", conta.</p> <p>De um editorial denominado "Caderno destes dias", com propostas próprias e um pedido à comunidade para que enviasse também materiais, o lado virtual foi ganhando "maior consistência".</p> <p>O 'takeaway' resulta "dessa aprendizagem" e vai de trabalhos como "Hoje é dia de clássico", com a leitura de obras marcantes do teatro, a inéditos como "A Tua Mesa Odeia-te", uma ficção a partir de objetos da companhia.</p> <p>Apesar de o digital ser "mais um meio", não pode "substituir-se a outras formas de fazer", até porque numa das dimensões da companhia, "levar o teatro às aldeias, dificilmente cumpre" essa missão.</p> <p>"O teatro pode ser muitas coisas, mas uma das suas dimensões mais importantes é a presença e, no contexto das Comédias, não estou disponível para abdicar", garante à Lusa.</p> <p>Dúvidas há muitas, por exemplo sobre a disponibilização de registos vídeo de "espetáculos que não são pensados para serem filmados", mas para apresentarem, e que foram captados como arquivo.</p> <p>Com dois disponibilizados para o público infantil, as Comédias já têm "dois ou três espetáculos, e está a avançar para mais", que são, agora, "trabalhados e registados para terem dignidade e qualidade de serem apresentados no contexto digital".</p> <p>Ao lado dos filmes que têm sido realizados ao longo dos últimos anos, estão vários 'podcasts', com a companhia a aplicar a estratégia não só às criações como estrutura profissional, mas também ao projeto pedagógico e ao projeto comunitário.</p> <p>Adiado para 2022 ficou "Estávamos para lá do tempo", um espetáculo da produtora e encenadora Tânia Guerreiro, que será apresentado em sala em 2022, mas que terá, também, um "'filme-espetáculo' que é, ele próprio, um objeto artístico e não um mero registo".</p> <p>A contagem decrescente para o espetáculo marca uma das novidades no 'site' das Comédias, e da sua página no Facebook, com uma conversa com os envolvidos na sua criação e com o autor do texto que lhe serviu de base, o escritor e jurista Álvaro Laborinho Lúcio.</p>