A investigadora Alexandra Magnólia Dias defendeu esta quarta feira que a Europa deve olhar para África, não só como fonte de instabilidade.
<p>“Os africanos estão à frente em termos de pagamentos via telemóvel, estão também já na charneira em termos de adopção de moeda digital. A Nigéria avançou com uma moeda própria de ‘bitcoin’, a Zâmbia está a seguir os passos e o Quénia também”, disse à Lusa a investigadora do Instituto Português de Relações Internacionais da Universidade Nova de Lisboa (IPRI-NOVA), a propósito da cimeira União Europeia – União Africana, que decorre quinta e sexta-feira em Bruxelas.</p> <p>Para a especialista em relações internacionais e estudos africanos, “esta abordagem de África apenas enquanto fonte de migrações irregulares, de pandemias, de conflitos e de instabilidade para a Europa (…) tem de ser alterada” e os europeus têm de perceber que há no continente africano “um espaço com enorme potencial de inovação”.</p> <p>Caso contrário, os europeus “vão ficar claramente para trás e os líderes africanos vão aproveitar as oportunidades que lhes são facultadas por outros parceiros”, alertou, lembrando a cooperação já existente entre a China e Angola. A investigadora defendeu que os países europeus devem também “olhar de outra forma para esta iniciativa africana que é a área continental de comércio livre”.</p> <p>“Se as sociedades do norte global têm a braços uma forte crise provocada por dois anos prolongados de uma pandemia muito difícil e há novos grupos de pobres dentro do norte global, o que é que vamos pensar das sociedades africanas e também das consequências muito negativas da pandemia ao nível de sectores críticos”, lembrou.</p> <p>E alertou que área continental de comércio livre, constituída em 2018 por 54 países africanos e que entrou em vigor em 01 de janeiro de 2021, “é uma área muito importante que já está a ser aproveitada por outros actores de internacionais, nomeadamente a China, com a sua a nova rota da seda e com a criação de acordos com estratégicos com Estados africanos em localizações estratégicas”.</p> <p>Exemplificou com a aproximação da China ao Djibuti, “por causa da localização estratégica e da importância do Porto de Djibuti no Mar Vermelho e como forma de entrada no canal do Suez”.</p> <p>Alexandra Magnólia Dias alertou ainda que os diplomatas africanos têm a percepção de que “os Europeus não falam a uma voz nas suas relações com os seus pares africanos e que, muitas vezes, interesses nacionais (…) acabam por se sobrepor ao plano multilateral”. </p> <p>E lembrou que a cimeira coincide com a presidência francesa da União Europeia, numa altura em que existe uma tensão entre Paris e algumas das suas ex-colónias, nomeadamente por causa da tensão com a Rússia e da presença crescente da empresa militar de segurança privada russa Wagner em países como a República Centro-Africana e no Mali. </p> <p>“Muito recentemente, o embaixador França foi expulso do Mali e houve uma ruptura de relações diplomáticas entre a França e o Mali e uma grande contestação interna à presença francesa”, recordou.</p> <p>Alertou por isso que “a questão a da rivalidade entre doadores tradicionais e as grandes potências e as suas ramificações para África vai ensombrar esta Cimeira”, considerando que será importante perceber “a forma como os africanos percepcionam estas rivalidades e como se posicionam neste tabuleiro tão complexo da actual conjuntura do da sociedade internacional”.</p>