O livro 'Os Soldados Fantasma', de José Manuel Barata-Feyo, resgata a memória dos mil portugueses que combateram as forças nazis na II Guerra Mundial (1939-1945), nas fileiras do Exército francês.
<p>Desconhece-se, todavia, o percurso dos portugueses que voluntariamente se alistaram nas fileiras do Exército francês, depois da declaração de guerra de Paris a Berlim, a 03 de setembro de 1939, e combateram as tropas alemãs-nazis, como refere o autor.</p> <p> </p> <p>"Para além do nome, local e data de nascimento, o historial e o destino desses portugueses esfumou-se, como se nunca tivessem existido enquanto soldados - soldados que morreram em combate, que foram feitos prisioneiros pelos alemães ou que sobrevieram".</p> <p>Segundo Barata-Feyo, "os arquivos históricos franceses dão uma lista com o nome de 905 portugueses, alguns dos quais repetidos". Todavia "foi possível identificar muito mais voluntários em outras fontes documentais".</p> <p>Segundo o autor, na secção dos militares mortos durante o conflito mundial, "consta apenas o nome de 89 voluntários portugueses, número que peca muito por defeito", pois terão sido entre 300 e 400.</p> <p>Barata-Feyo considera surpreendente o desaparecimento do historial dos militares portugueses que serviram a bandeira tricolor, face à "documentação abundante" que existe sobre os cinco milhões de homens que, em 1940, constituíam as Forças Armadas francesas.</p> <p>"Nada ou quase nada existe, de fonte oficial, sobre os cerca de dez mil voluntários [portugueses e de outras nacionalidades] que integraram os três 'Régiments de Marche' dos Voluntários Estrangeiros" (RMVE), escreve Barata-Feyo.</p> <p>Esta falta de informação é um "contraste flagrante com toda a documentação disponível sobre os 357 civis, portuguesas e portugueses, que lutaram na resistência, em França, contra a ocupação nazi". Sobre estes portugueses "foi possível encontrar e aceder aos seus dossiês individuais" no mesmo Serviço Histórico, instalado no Château de Vincennes, em Paris. </p> <p>Refira-se que José Manuel Barata-Feyo tinha já investigado a participação de portugueses na resistência, tendo publicado em 2019 o livro 'A Sombra dos Heróis', com dados inéditos sobre essa participação.</p> <p>Num arquivo em Caen, no norte de França, Barata-Feyo encontrou o que poderá ser uma pista para o desaparecimento de certos dados, a destruição pelos militares franceses para que determinadas informações não caíssem nas mãos das tropas nazis.</p> <p>No arquivo da cidade normanda, foi encontrado um relatório militar de um oficial dos RMVE que dá conta da destruição de documentação a 6 de junho de 1940, quando o regimento se rendeu às tropas invasoras alemãs. Entre os documentos que "o Exército francês não queria que caíssem nas mãos do inimigo" estariam, "talvez, os diários de operações de voluntários".</p> <p>Todavia, alerta Barata-Feyo, tal "não justifica o desaparecimento dos processos individuais, o registo feito na altura em que os portugueses se inscreveram como voluntários". "O processo individual [com a morada e os nomes de familiares e amigos mais próximos, caso morressem em combate] não era um documento militar mais ou menos secreto, como Diário de Operações dos regimentos, nem certamente foi levado para a frente de batalha", refere o autor.</p> <p>"Igual opacidade - mas aqui deliberada - manifesta a Legião Estrangeira francesa" que incorporou "pelo menos 125 portugueses", cujos nomes se conhecem e que engrossaram as fileiras dos 11.º e 12.º Regimentos Estrangeiros de Infantaria e da 13.ª Meia-Brigada.</p> <p>Aqui qualquer investigação só é possível aos próprios interessados, ou aos seus representantes ou descendentes, caso tenham falecido, segundo a resposta recebida por José Barata-Feyo do Comando da Legião.</p> <p>No prefácio a 'Os Soldados Fantasma', o militar Rodrigo de Sousa e Castro realça que, apesar das dificuldades da investigação, "o autor dá-nos 'flashes' impressivos sobre a condução das operações militares do invasor alemão e dos defensores de França, a natureza e intensidade dos embates, e sobretudo os inúmeros casos de heroísmo protagonizados pelos voluntários, bem como as peripécias operacionais quase inéditas", destacando a atuação da 9.ª Companhia, 'La Nueve', composta por republicanos espanhóis e dois portugueses que tinham combatido na Guerra Civil de Espanha (1936-1939) que foram dos primeiros combatentes a entrar em Paris, antes da libertação da cidade pela tropas aliadas (Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália, entre outros países).</p> <p>Quanto aos voluntários portugueses, adianta o autor que "a quase totalidade é oriunda do Algarve e das províncias a norte do Tejo", não tendo, no entanto, sido possível "definir o percurso individual de todos eles", sendo porém "muito provável que a esmagadora maioria fosse composta por 'emigrantes económicos'", mas também alguns exilados, vindos de Espanha, onde lutaram nas hostes republicanas contra os nacionalistas de Francisco Franco (1892-1975).</p> <p>O autor verifica que, no início da II Guerra Mundial, viviam em França entre 20.000 e 25.000 portugueses.</p> <p>Segundo a consulta dos documentos, a maioria dos portugueses que se alistaram tinha entre 25 e 40 anos, havendo alguns mais novos, com 18 e 19 anos, mas também mais velhos, como António da Silva, de 53 anos, enviado para uma Secção de Ajudantes.</p> <p>Barata-Feyo refere ainda que alguns "foram dos primeiríssimos estrangeiros a voluntariar-se", como Augusto Afonso da Costa, natural de Montalegre, cuja matrícula de recrutamento é a nº. 866, entre mais de 50.000, ou José de Oliveira, que se alistou em Valence, no sul de França, sete dias depois após a declaração de guerra da França à Alemanha.</p> <p>Segundo cálculos do autor, "dos mil portugueses alistados no Exército francês terão sobrevivido entre 300 e 400 homens", cujo rasto procura delinear nesta obra.</p> <p>José Manuel Barata-Feyo, exilado político em Paris durante a ditadura portuguesa, foi director de Informação da RTP2 e responsável, na década de 1980, pelos programas 'Grande Reportagem' - que lançou depois em revista semanal -, 'Portugal sem Fim' e 'Enviado Especial' da televisão pública. Foi correspondente em França da agência noticiosa portuguesa (ANOP), trabalhou para o International Herald Tribune, o New York Times News Service e a Radio France, e colaborou com o jornal francês Libération.</p> <p>Como repórter recebeu prémios nacionais e estrangeiros de televisão, como o prémio Frantz Fanon, da Union of National Radio & Television of Africa (URTNA).</p> <p>É autor dos livros 'O Grande Embuste' e a 'Última Missão'. em 2019, também pelo Clube do Autor, publicou 'A sombra dos Heróis - A História Desconhecida dos Resistentes Portugueses que Lutaram contra o Nazismo'.</p> <p> </p> <p>Fonte: https://www.noticiasaominuto.com/cultura/2463871/obra-de-barata-feyo-evoca-memoria-de-portugueses-que-lutaram-na-ii-guerra</p>