As escritoras Ana Maria Magalhães e Isabel Alçada escolheram uma rapariga que decide entrar para a Força Aérea para protagonista de um livro sobre "a igualdade de direitos e oportunidades" entre mulheres e homens.
<p>Em conversa com a Lusa, via zoom, as duas escritoras -- provavelmente as mais transversais a tantas gerações de jovens leitores portugueses, através de séries como "Uma Aventura" -- contaram como foi abordar o tema da igualdade de género com recurso à história narrativa em "O longo caminho para a igualdade-mulheres e homens no século XXI".</p> <p>"A melhor forma de as pessoas pensarem sobre os assuntos é colocarem-se na pele de personagens, sobretudo os jovens, e equacionarem o problema, não de uma forma abstrata, mas numa situação concreta", considerou Isabel Alçada.</p> <p>"Somos diferentes, homens e mulheres, e vamos continuar a ser", constatou Ana Maria Magalhães, assumindo-se grata às sufragistas e às feministas. "Falta o mais difícil: o preconceito que existe dentro de nós (...). São séculos de história e isso não se apaga por decreto", vincou.</p> <p>As duas autoras aceitaram o desafio da Imprensa Nacional -- em parceria com o iGen-Fórum de Organizações para a Igualdade, que agrega 69 organizações, entre as quais a Lusa -- para escreverem um livro sobre o tema e escolheram como protagonista uma rapariga que quer ir para a Força Aérea.</p> <p>"Hoje é permitido e pode fazê-lo, mas como vão as pessoas reagir?" -- foi desta pergunta que partiram para acompanhar a reação dos amigos e suas famílias. "Mesmo as pessoas mais evoluídas" têm "preconceitos que nem sabem que têm", notou Ana Maria Magalhães.</p> <p>"Tivemos de analisar a nossa própria visão destas questões para poder escrever o livro de uma forma o mais possível isenta. Não queremos endoutrinar, de maneira nenhuma, queremos, sim esclarecer, para que as pessoas pensem no assunto e vejam onde está a justiça das situações", realçou Isabel.</p> <p>"De facto, ainda não há igualdade de género", resumiu. "Se não fizermos nada, é mais difícil que as pessoas pensem que não é assim que deve ser", defendeu.</p> <p>Ora, o "esquema de valores, princípios e costumes" vigente naturaliza a desigualdade. Veja-se o caso da Força Aérea, onde as mulheres só podem entrar desde 1990: as mulheres têm o direito de lá estar, "mas não é costume" fazerem essa opção.</p> <p>"Estamos muito melhor, mas a igualdade não existe ainda. E a primeira coisa para conseguir melhorar a situação da mulher é ter consciência de que ela não existe", frisou Isabel, constatando: "Houve uma mudança abissal."</p> <p>À igualdade não se chegará "de um dia para o outro", mas "a pouco e pouco", confia Ana Maria, acreditando que levará "mais uma geração ou duas".</p> <p>Aos 70 anos, Isabel recordou que o seu pai "não levou nada a bem" a intenção que manifestou, em adolescente, de que queria "ter uma vida profissional". Mas a mãe, que não trabalhava, defendeu-a.</p> <p>Já Ana Maria vivia "num verdadeiro matriarcado", se fosse perguntar ao pai se podia fazer alguma coisa ele respondia "vai perguntar à mãe", e educou a filha e o filho "exatamente da mesma maneira".</p> <p>As duas autoras, professoras de Português que já publicaram juntas mais de uma centena de livros, assinalam que sempre incluíram protagonistas femininas capazes e determinadas nas suas histórias para crianças e jovens.</p> <p>A série "Uma Aventura", por exemplo, conta com duas meninas "aventureiras e despachadas", inspiradas em duas alunas "reais", que "eram do século XX, mas já estavam no século XXI".</p> <p>Consciente de que, na prática, ainda há áreas vedadas às mulheres, Isabel Alçada contrapôs que noutras é preciso "apoiar sobretudo os rapazes", como é o caso da leitura.</p> <p>"Há estudos que demonstram que as meninas leem mais do que os meninos", lembrou, sublinhando que "a leitura é absolutamente infraestrutural de todo o trabalho escolar".</p> <p>Ora, vincou Ana Maria, a igualdade "tem que funcionar nos dois sentidos, porque se uma rapariga hoje diz que vai para a Força Aérea e isso desencadeia uma conversa em que nem todos estão de acordo, se um rapaz disser que quer ser educador de infância e ir trabalhar para uma creche também desencadeia uma conversa em que as pessoas também não estão de acordo".</p> <p>Dirigido a adolescentes, rapazes e raparigas, o livro "O longo caminho para a igualdade-mulheres e homens no século XXI" tem duas partes: uma história de ficção e um conjunto de dados e informações reais.</p> <p>O livro será lançado a 08 de março, Dia Internacional da Mulher, num evento de acesso livre, às 16:30, transmitindo em 'live streaming' através do site do iGen (http://forumigen.cite.gov.pt/).</p>